Um amor das antigas (Apenas um relato real)
O ÚNICO TEXTO QUE ME EMOCIONOU DE VERDADE EM ESCREVER.
Hoje eu estava em um restaurante onde fui almoçar sozinha, e
sempre aproveito esses momentos para apreciar a vida à minha volta. Em momentos
assim, sou apenas plateia quase incógnita a ver vida a se apresentar. Nesse
palco de um show diário, algumas cenas chamam minha atenção. Nesta ocasião,
observei que um homem que aparentava já ter vivido umas 80 primaveras, havia
colocado seu prato sobre a mesa, mas não se sentou. Achei curioso, e sendo
visível que aguardava alguém, flanei meus olhos pelo salão buscando identificar
quem seria. Por um instante não pude perceber nenhum movimento que denunciasse
a razão daquela espera. Voltei meus olhos para ele, e vi que fitava o chão,
colocava as mãos nos bolsos, observava o prato com a comida escolhida, e sem
demonstrar nenhuma impaciência, simplesmente aguardava.
De repente, o vi esboçar um sorriso, não apenas com os
lábios, mas seus olhos sorriam junto. Seu rosto se iluminou sem receios, e seu
olhar me indicou a direção certa. Pude ver que do outro lado, vinha uma linda
figura frágil, com passos curtos e lentos, e aquela delicadeza delatava seus
anos vividos. Ao vê-la se aproximando da mesa, ele deu a volta e puxou a cadeira
para ela, que agradeceu com um carinho em suas mãos. Ele então retornou ao seu
lugar de antes, e finalmente se sentou e começaram a comer.
Confesso que tudo que estava ali nas entrelinhas, me
emocionou e mexeu com minha imaginação. Peguei-me imaginando há quanto tempo
eles estariam juntos. Haveriam se encontrado já na idade madura? Será que foram
o primeiro amor um do outro? Tentei supor as tempestades as quais
sobreviveram... E o que, meu Deus, teriam feito durante anos de relacionamento
para que nunca morressem o carinho e a delicadeza?!
Ao despertar do meu transe, lembrei como as relações de hoje
são construídas sem base, em solo árido, sem cultivo, de como qualquer brisa
abala as estruturas tão mal erguidas em mentes deturpadas e corações vazios. Em
que momento decidimos mascarar sentimentos passageiros e os batizarmos de amor,
e transformamos o vazio do depois no habitual a ser vivido? Quando se tornou
dispensável lutar pelo que já foi construído? E quando, por favor, me digam...
Quando foi que cegamos para as consequências do egoísmo e do abandono?
Admito que senti uma vontade enorme de sentar ao lado deles e
pedir para me contarem sua história. Tenho certeza que ouviria relatos de dias
difíceis, de dores que ficaram no passado, de sacrifícios vividos, saberia do
desânimo que os dominou em um momento qualquer, me dariam ciência que nunca foi
fácil, como jamais será para nenhum de nós... Mas com toda certeza, eles me
diriam como valeu a pena chegar aonde chegaram e ainda se olharem com carinho,
e agradecer pela espera educada para sentar-se a mesa, e se sentir amado em um
simples toque de mãos... E que embora a vida seja uma só é essencial que se
perceba que cada pessoa também é única e que é preciso sempre renovar o amor, e
quantas vezes for preciso, se reapaixonar por quem vale a pena.
No fim, só consegui concluir que eles fizeram suas escolhas,
e independente dos fortes ventos que tenham sacudido os ramos daquelas árvores
tão bem cultivadas, suas raízes jamais saíram do lugar.
Gil Façanha
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